sexta-feira, 1 de maio de 2015

Discurso de Francisco Soares Silva no 1º de Maio de 1908

Discurso de Francisco Soares Silva no 1º de Maio de 1908 Camaradas: “Os túmulos, por enquanto, dos homens célebres são as relíquias da humanidade. O que vimos aqui fazer é simplesmente levantar uma tribuna e fazer reviver as doutrinas do Mestre. Não queremos com estas sinceras homenagens, classificar Antero como um santo, para que o canonizem mais tarde; isso não, porque ele não foi um Inácio de Loyola, nem um Torquemada … mas foi um mártir e um dos mais sinceros apóstolos da causa reivindicadora dos que trabalham. Para se poder avaliar a obra social de Antero é preciso que eu com duas palavras diga o que ele foi , mas … tenho pena de não ver aqui quem de muita boa vontade desejava ver; então numa ordem de princípios e factos demonstraria a certos cavalheiros que desde há muito não ando dormindo! O homem que dorme debaixo deste túmulo o sono perene, cursou a Universidade de Coimbra pela qual era bacharel formado em Direito, e, ao fim de quatro anos foi para Paris envergar a blouse de operário, trabalhando como um modesto artífice tipógrafo. Por isso Antero conhecia como nenhum outro escritor português a vida desgraçada do operariado. Qual seria a ideia de Antero de Quental, fazendo-se operário em Paris, depois da sua formatura em Direito? Que necessidades levaram este ilustre filósofo a fazer-se operário? Ah! Camaradas, este ponto é de grande responsabilidade e neste caso calar-me-ei. E sabeis porque é grande responsabilidade? Porque eu tinha de ser imparcial ao demonstrar o carácter de Antero, comparando-o com muitos que no inicio da sua vida politica, vêem enrolados na sua capa académica, com o pseudónimo de democratas, defendendo com muita retórica os direitos do povo, e depois de conseguirem o que desejam, vendem as suas ideias e convicções (se algum dia possuíram!) para se tornarem inimigos acérrimos das classes que defendiam com tanta verbosidade. ….. Antero viveu com o povo e morreu com o povo. Por isso os homens que defendem com tanto amor e lealdade as vítimas do trabalho, só têm jus às nossas sinceras homenagens e a que lhes desfolhemos flores sobre as suas campas”. (Vida Nova, nº 2, 25 de Maio de 1908)