terça-feira, 1 de janeiro de 2013

Governos e Bandidos

Acontece com os governos o mesmo que com as quadrilhas de bandoleiros: a diferença é que os bandoleiros atacam especialmente os ricos, enquanto os governos abusam, sobretudo, dos pobres e protegem os ricos que os ajudam a praticar os seus crimes. O bandido da Calábria que impõe um tributo aos que querem livrar-se dos seus assaltos, ao menos arrisca a vida. Os governos não arriscam nada e tudo põem em execução com a mentira permanente e o engano diário. O bandido não forma a sua quadrilha violentamente; mas os governos recrutam os seus exércitos à viva força. Para o bandido, todos que lhe pagam um tributo desfrutam das mesmas garantias de segurança, para o Estado, os que se aproveitam da força e ajudam o engano,não só se tornam mais protegidos, mas até recompensados, os mais garantidos, uma guarda constante os rodeiam: são os imperadores, os reis, os presidentes, cada um dos quais recebe a maior parte das riquezas que se repartem, arrancadas ao contribuinte, logo, segundo a maior ou menor participação que tenham nos crimes do governo, são garantidos e recompensados os generais, ministros, governadores e assim sucessivamente até os mais modestos policiais. Os menos garantidos são os que recebem menores ordenados. Os que permanecem alheios as manobras governamentais, os que se negam ao pagamento dos impostos ou ao serviço militar são severamente castigados, o mesmo fazem os bandidos. O bandido não perverte premeditadamente as suas vítimas, mas os governos para conseguirem os seus propósitos, entregam à depravação gerações inteiras de crianças e adultos, ensinando-lhes doutrinas mentirosas de religião e patriotismo. Os mais cruéis dos bandidos – Stenka, Racine, Cartouche, Mandrin – pela sua crueldade implacável e refinada, sem recordar aqui os tiranos célebres como Ivan, o Terrível, Luis XI, Izabel, etc..., não podem comparar-se aos governos contemporâneos, constitucionais e liberais, com as suas prisões celulares, os seus batalhões disciplinados, as suas carnificinas, as quais dão o nome de guerras. Os governos, como as igrejas não devem ser tratados senão com veneração ou com desprezo. O tempo da veneração vai passando para os governos, apesar de toda hipocrisia que empregam para conservar o seu prestígio. A hora chega e os homens compreenderão finalmente que os governos são instituições mais que inúteis, daninhas e imorais, as quais nenhuma pessoa honrada deve prestar o seu concurso, nem aceitar os seus favores. Por Liev Tolstói, retirado do periódico anarquista ‘A Terra Livre’ (São Paulo), 1º de Maio de 1906, número 8, página 3, & também do semanário anarquista, ‘A Vanguarda’ (São Paulo), 23 de Junho de 1921, número 45, página 4.